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terça-feira, 23 de outubro de 2012

Era uma vez uma escola

Poema de Andrea Cecília Ramal, em homenagem a Paulo Freire


Era uma vez uma escola
onde trabalhava um mestre
que ensinava diferente
de tudo o que conheceste.

Em sua aula, não dizia
"nada sabes, só eu sei",
nem falava assim: "copiem
tudo isso que expliquei".

Disse que não era ele
só quem tinha que ensinar
e falou que todo mundo
tinha algo para dar.

Ninguém educa ninguém"
Ninguém "dá" educação:
"os homens é que se educam,
um ao outro, em comunhão".

Ensinando o alfabeto
não pediu, como já vi
pra escrever "uva", "vovó",
"asa", "ema" ou "siri
pediu pra escrever "tijolo",
"enxada", "trabalhador",
ensinou a escrever "salário",
"justiça", "direito", "amor".

Depois ele então pedia
pra falar nossa opinião
pois essas belas palavras
estavam nas nossas mãos.

Nós sentados sempre em roda
íamos tendo consciência
de que toda a teoria
de que toda a ciência
só têm valor para o mundo
se ajudam a transformar
se ajudam o homem pobre
aos problemas superar.

Naquela sala de aula
se formava todo dia
em nossa humilde cabeça
uma linda utopia
Podemos mudar o mundo!
Pra isso serve aprender!
Pra construir a sociedade
nossa enxada é o saber!

Era assim como se dava
cada aula deste mestre
e no fim não tinha nota
nem tinha prova, nem teste:
Cada um ia falando
se se sentia aprovado
porque percebia em si
como ele tinha mudado.

Tu também vais hoje à escola?
Tu também tens o teu mestre?
E tu, como te avalias
No fim de cada bimestre?
Quanto é que tu mudaste
em razão e sentimento?
O que deste tu ao mundo
com o teu conhecimento?

Não te esqueças de uma coisa:
se acaso o teu professor
não te vê como pessoa,
não procura teu valor

Se contigo nada aprende
se não pode te escutar
e apenas nas suas provas
é que podes te expressar

Se não fala de justiça
se não quer transformação
se não vê na aprendizagem
um instrumento da ação

Se ele nunca põe afeto
na sua aula exemplar
e é só ele quem escolhe
a matéria que vai dar

Fala a ele desse mestre
que acabei de te falar;
conta a ele dessa escola
onde se pode sonhar.

Quem sabe ele te escute
e juntos possam viver
a fascinante aventura
que se chama aprender.

(In: Histórias de gente que ensina e aprende. São Paulo: EDUSC, 1999, pp. 27-28.)


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